Um dos grandes desafios que as pessoas vivendo com HIV/Sida enfrentam, principalmente nas zonas recônditas, tem que ver com a falta de alimentação, visto que o tratamento antirretroviral é pesado e requer que os mesmos se alimentem devidamente.

A fragilidade da alimentação, associada ao estigma e à descriminação, tem contribuído para que parte dos doentes desistam do tratamento, levando-os a uma debilidade física e tornando a sua recuperação difícil.

Recentemente, o Conselho Nacional de Combate ao Sida (CNCS) lançou um estudo que aponta que cerca de 500 mil pessoas abandonaram o tratamento anti-retroviral em Moçambique.

De acordo com o mesmo estudo do CNCS, dois milhões de pessoas recebem o tratamento anti-retroviral no país, sendo que vinte e cinco por cento tem abandonado o tratamento.

Esta situação preocupa não apenas o Governo, como também as associações que trabalham com este grupo social.

É o caso da Associação Tionane Tense, uma organização sem fins lucrativos, que se dedica à assistência domiciliar a portadores de HIV e SIDA, Tuberculose, Malária, com enfoque para a população chave (mulheres trabalhadoras de sexo). Após a assistência nas comunidades, a associação tem como missão encaminhar os pacientes para uma unidade sanitária para que possam prosseguir condignamente com o tratamento.

Localizada no bairro de Liberdade, em Moatize, na província central de Tete, com 25 membros, a Associação Tionane Tense, está neste momento a assistir cerca de 150 pacientes.

Em entrevista ao Observatório Cidadão para Saúde (OCS), Suzana Chikuna, membro da organização, lamentou o facto de diariamente deparar-se com pacientes que, por não se alimentarem condignamente,  não suportam a medicação, acabando por abandonar o tratamento e consequentemente perdendo a vida.

Suzana Chikuna, activista de saúde

De acordo com Suzana Chikuna, de ano passado a esta parte, três pacientes que eram assistidos pela Associação Tionane Tense morreram por falta de apoio, sendo que um deixou crianças órfãs.

“Apesar das visitas frequentes, o paciente não tinha alguém que lhe pudesse ajudar na alimentação.”

“Constitui, pra a associação, uma situação chocante, visto que o trabalho desta é conseguir a recuperação plena dos doentes que esta assiste”, salientou.

Antes da perda deste pacientes, Suzana explicou que os membros da associação chegaram a procurar apoio ao núcleo distrital do combate ao SIDA, mas foram recomendados a recorrer à Acção Social. A associação, por sua vez, disse que se deveria recorrer a Unidade Sanitária mais próxima, alegadamente porque existe lá um gabinete da acção social.

A associação depara-se, nalgumas vezes, com o abandono de tratamento por parte da alguns pacientes, aparentemente por acharem que estão curados da doença. Mas passado algum tempo, o vírus reativa-se com mais agressividade e a pessoa fica debilitada.

“Para estes casos, temos que fazer de novo uma sensibilização e levar o doente para o hospital”, salientou.

Contrariamente a este cenário, tem sido uma grande alegria, não só para ela, como para a Associação no geral, quando consegue recuperar um doente que já estava debilitado.

“Sabe-se que quando a pessoa deixa de medicar o vírus volta com muita força e é trabalhoso para esta mesma pessoa se recuperar da recaída. Eu posso dizer que os momentos que mais me marcam positivamente são estes por termos conseguido reabilitar os pacientes”, sublinhou.

“Desde que comecei a trabalhar na Associação, já recuperámos vários pacientes que estavam debilitados por conta do HIV/SIDA”.

Suzana Chikuna, que trabalha como activista de saúde desde 2005, explicou que as pessoas na comunidade, quando adoecem, não se costumam apresentar à unidade sanitária. Assim sendo, é papel da associação incentivá-las a buscar ajuda no hospital.

“Nós fazemos entender a pessoa que não é pelo facto de estar infectada pelo Vírus que vai morrer. Se seguir devidamente o tratamento pode viver por muitos e longos anos”, vincou.

Falta de Transporte como Barreira

Em relação às dificuldades com que a associação se depara, no âmbito da realização de suas actividades, a fonte apontou, como sendo a principal, a falta de meio de transporte para visitar as comunidades. Mesmo assim, entretanto, a associação tem conseguido “cumprir com brio as missões lhes se colocam a realizar no quotidiano.”

“ Além da falta de transporte, deparamo-nos, às vezes, com doentes sem comida para que possam seguir com a medicação, sendo que se alguns debatem igualmente com tuberculose e antirretrovirais”, afirma.

Apesar de os recursos serem escassos, a associação tem envidado escorços para ajudar os pacientes, juntando farinha de milho, óleo e outros produtos básicos para oferecer aos doentes.

Para além de oferecer alguns produtos básicos, os membros da associação têm-se dedicado à educação nutricional, aconselhando os pacientes para que recorram a alimentos de fácil acesso, como é o caso da matapa e da moringa, assim como malambe e amendoim.

Para dar continuidade ao trabalho nas comunidades, ajudando a reabilitar pacientes gravemente doentes, a associação pede apoio a pessoas ou empresas de boa fé.

“Também gostaríamos de ter algum tipo de relatório para registar os nosso trabalhos. Apesar de o Governo reconhecer que estamos a trabalhar, não existe nenhum registo dos nossos trabalhos”, disse a fonte.

Sobre os serviços de saúde, de acordo com Chikuna, o sector registou avanços significativos, mas mesmo assim há necessidade de melhorar cada vez mais o atendimento.

De referir que o OCS realizou, em 2021, um estudo sobre Dinâmicas Orçamentais do Sector da Saúde em Moçambique: com Enfoque no Financiamento à Programas de Saúde Sexual & Reprodutiva e HIV/SIDA. A pesquisa indica que de 2018 a 2020, a despesa com acções de combate ao HIV/SIDA aumentou no âmbito central em cerca de 59,7%. Contudo, a nível provincial, diminuiu em cerca de 42%, contrariando o processo de descentralização em vigor no país.

Em termos per capita, a despesa do sector da saúde tende a reduzir desde 2013, saindo de US$ 28,69 para US$ 15,41, em 2020. O montante de 2020 representa um quarto do que seria necessário, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) (US$ 60,00) e corresponde a apenas 6% do que é necessário para atingir os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável até 2030 (US$271,00).

O mesmo valor (US$ 15,41) está também abaixo da média de África (US$ 32,00 per capita). Isto significa que a despesa da saúde não está a acompanhar a tendência de crescimento da população, o que pode comprometer a melhoria da prestação de bens e serviços de Saúde Sexual Reprodutiva e HIV/SIDA, por exemplo.

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