Parte I
Contextualização
O Orçamento do Estado para o ano de 2020 surgiu num contexto adverso. A eclosão e rápida propagação da pandemia da COVID-19 que alteraram todos os paradigmas económicos e sociais normalmente aceites, colocando à prova a capacidade do país para responder à demanda pelos serviços de saúde e protecção social. Isso veio agravar a situação de crise económica que Moçambique já enfrentava pelo excessivo endividamento público, desaceleração do crescimento económico, baixo poder de compra da maioria da população que vive em estado de pobreza extrema, aumento da inflação, ataques armados no Centro e Norte e desastres naturais cujos casos extremos foram os ciclones Idai e Kenneth.
Inicialmente, em termos macroeconómicos, as expectativas de retorno da economia não apresentavam estruturalmente sinais credíveis, com previsões de crescimento em torno dos 2.2% num contexto em que todas as previsões da economia global e regional apontavam para um cenário de recessão.
A economia nacional vem apresentando debilidades estruturais, que exige acções eficientes por parte dos decisores e gestores de políticas públicas que enfrentam pressões sociais de modo a demonstrar resultados visíveis e de impacto imediato face à situação do novo normal.
A presente análise enquadra-se nos esforços de monitoria da gestão das finanças públicas e reporta a execução do Orçamento do Estado no sector da saúde de Janeiro a Setembro de 2020. Faz-se uma análise comparativa, olhando para períodos homólogos de Janeiro a Setembro de 2019 e 2020 em termos de realizações no sector relativamente às alocações.
Execução orçamental no sector da saúde de Janeiro a Setembro de 2020
O sector da saúde é definido como sendo prioritário na alocação de recursos no OE 2020, onde é destacado como um dos três sectores (Educação, Saúde e Agricultura) com permissão para admitir pessoal novo. Apesar da saúde fazer parte dos sectores prioritários, o Governo não cumpriu com o compromisso internacional de alocar como percentagem do total do OE pelo menos 10% para o sector; o valor real alocado é de 9%.
De 2019 a 2020, os recursos destinados ao sector da saúde cresceram de 29.106 para 31.085 milhões de meticais, um aumento de 6.8%; a execução no período de Janeiro a Setembro de 2020 aumentou cerca de 37%, ou seja, passou de 50.4% em 2019 para 69% em 2020, acima das médias entre as outras funções económicas do OE, que cresceram de 60% para 68%, respectivamente.
A figura 1 mostra que o aumento do grau de execução de Janeiro a Setembro de 2020 deveu-se, em grande medida, ao elevado grau de execução da despesa de funcionamento (78%) e pela despesa do investimento externo (20%). Pelo elevado grau de realização do investimento, é previsível que, até ao final do ano, a execução seja completa.
Com efeito, no período em análise, as despesas de funcionamento reduziram de 83% em 2019 para 78% em 2020, uma redução de 5 pontos percentuais. Mais ainda, as despesas de investimento interno igualmente reduziram de 4% para 2% em igual período, ao passo que o investimento externo cresceu significativamente em 7 pontos percentuais, passado dos anteriores 13% em 2019 para os 20% em 2020.
Figura 1: Grau de realização segundo a classificação funcional

Nota-se que o orçamento da saúde regista uma redução no volume de recursos externos resultantes do acordo de donativos. Conforme a Tabela 1 ilustra, a realização do valor de donativos destinados ao Fundo Comum da Saúde (FC-ProSaúde) diminuíram em 24% no período homólogo de Janeiro a Setembro (um valor notável, contando que neste período o total de donativos destinados a cobrir o défice do OE 2020 cresceu em 89%). O peso do valor da realização dos donativos ao FC-ProSaúde caiu para 6.2% (9.1% em 2019) do total dos donativos e 0.8% (2% em 2019) do total dos recursos externos (donativos e créditos).

Em termos de despesa total destinada ao FC-ProSaúde houve uma redução. Nas respectivas execuções, de Janeiro a Setembro, isto equivaleu a uma redução de 30%. Os graus de realização dos respectivos orçamentos até Setembro de 2019 e 2020 foram de cerca de 40% e 45%, respectivamente, um crescimento de 5 pontos percentuais.
Ainda no âmbito do financiamento ao Orçamento do Estado, o Governo solicitou um montante de USD 700,0 milhões para fazer face aos efeitos negativos na economia, decorrentes da pandemia da COVID-19, dos quais houve compromissos no valor de USD 808,4 milhões de que resultou em desembolsos no valor USD 452,2 milhões (figura 1) dentro do Plano Nacional de Prevenção e Resposta para a Pandemia [COVID-19] que, entretanto, não foi divulgado ao público.
A execução das despesas do COVID-19 ascende ao montante de 16.352,3 milhões de Meticais (USD 236,6 milhões), sendo que os Fundos disponibilizados por via da Conta Única do Tesouro (CUT) a respectiva despesa está devidamente incorporada no Módulo de Execução Orçamental, enquanto os fundos disponibilizados directamente ao Ministério da Saúde fora do Orçamento do Estado (Off-Budget) e os Donativos em Espécie, serão incorporadas através de balancetes no próximo trimestre.
O Governo não cumpriu com o compromisso internacional de alocar, como percentagem do total do OE, pelo menos 10% para o sector de saúde e deste modo o sector da saúde permanece com um orçamento deficitário em 5%, contrariamente à proposta inicial do executivo.
O sector da saúde, em termos reais, recebeu menos recursos devido à influência dos agregados macroeconómicos que reduziram o poder de compra da moeda nacional. Como resultado, em quase todos os indicadores as metas do Plano Estratégico estão comprometidos quanto ao seu cumprimento.
Fig 1: Ponto de situação dos compromissos para financiamento do Plano de Mitigação dos efeitos do COVID-19

Gostaria de saber que actividades em concreto foram financiadas com os recursos alocados quer nas despesas de funcionamento quer nas despesas de investimento