Assunto: Indumentária como barreira ao acesso aos serviços de saúde em Moçambique

O Observatório do Cidadão para Saúde (OCS), uma organização da sociedade civil moçambicana, vem anunciar que submeteu uma petição ao ministro da Saúde no dia 28 de Julho, solicitando a remoção imediata da restrição ao acesso ao serviço de saúde com base na indumentária ou aparência, em todas unidades sanitárias do país. A sociedade civil e outras entidades têm estado a receber queixas de cidadãos sobre a prática de proibição de acesso aos serviços de saúde pública em várias unidades sanitárias, incluindo no edifício do Ministério da Saúde (MISAU), devido à indumentária ou aparência considerada como sendo “não apropriada”.

As unidades sanitárias em várias regiões do país fixam avisos e anúncios no sentido de proibir a entrada de quem apresenta-se de determinado tipo de traje ou aparência, nomeadamente: saia acima do joelho, vestido ou blusa de alça ou decotada, calções, sandálias, chinelos, cabelo despenteado ou com rastas, etc. Os grupos mais afetados são mulheres e raparigas, jovens, adolescentes, minorias sexuais e cidadãos que se apresentam de dreadlocks que sofrem estigma pelos serviços de saúde, devido a sua apresentação.

Moçambique sendo um país onde as populações percorrem uma média de 25 a 60 quilómetros para chegar à unidade sanitária, a proibição do acesso com base na indumentária vem agudizar as já existentes desigualdades estruturais de acesso aos serviços de saúde. A situação levanta questionamentos legais, pois ao impor-se um dress-code, limita-se o direito ao acesso à saúde, previsto na constituição da Constituição da República de Moçambique (CRM).

A resolução nº.73/2007 de 18 de Dezembro que adopta a Carta Moçambicana dos Direitos e Deveres do Doente, também extensivo a todos os utilizadores do sistema de saúde, que regula a relação entre o doente e os profissionais de saúde, não prevê a discriminação com base na indumentária. Portanto, não existem instrumentos legais que dispõem sobre a indumentária e aparência do utente dos serviços de saúde, senão os regulamentos destinados à profissionais do sector de saúde.

A saúde é um direito fundamental de acordo com o artigo 89 da CRM que diz que todos têm o direito à assistência médica e sanitária, nos termos da lei, bem como o dever de promover e defender a saúde pública. O acesso à saúde não deve ser determinado com base em aspectos, elementos e instrumentos que denotam discriminação. A questão da limitação do acesso aos serviços de saúde com base na indumentária do utente, viola flagrantemente o princípio da não discriminação.

A questão das garantias individuais dos direitos e liberdades dos cidadãos plasmado no artigo 56 da Constituição, o que abrange o direito à saúde. A limitação do direito à saúde com base na indumentária não visa à salvaguarda de outros direitos ou interesses protegidos pela CRM, pelo que, é uma prática ilegal e contrária à lei mãe.

A lei só pode limitar o direito à saúde e suas garantias nos casos expressamente previstos na Constituição. Ora, no que diz respeito a limitação do direito à saúde com base na indumentária ou aparência do utente, esta restrição não encontra enquadramento legal, sendo uma prática contrária à CRM. A prática de limitação do direito à saúde com base na indumentária ou apresentação do utente não está prevista na CRM, ou noutra norma legal infraconstitucional, o que significa que se está perante uma prática que viola o direito fundamental à saúde, constitucionalmente consagrada.

A responsabilidade sobre a prestação dos serviços de saúde cabe em primeira linha ao Estado, através das suas instituições relevantes para o efeito, tais como: Ministério da Saúde (MISAU) suas direções, institutos e unidades sanitárias. Cabe ao Estado a obrigação primordial de respeitar, proteger e garantir o direito à saúde na perspectiva da salvaguarda dos direitos do doente e outros utilizadores do Serviço Nacional de Saúde.

Pelo disposto acima, o OCS requereu ao ministro da Saúde, para que se digne mandar proibir, expressa e inequivocamente através de afixação das competentes notas de aviso ou de orientação, a prática de limitação de acesso à saúde com base na indumentária ou aparência do utente dos serviços de saúde em todas as instituições de saúde do país.

Maputo, 03 de Agosto de 2020

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