
Cerca de 53% de pessoas com deficiência, o equivalente a mais de 400 mil cidadãos, não tem acesso a medicamentos no Sistema Nacional de Saúde (SNS).
Os dados constam do estudo sobre Acesso a Medicamentos para Pessoas com Deficiência, apresentada, Terça-feira última, em Maputo, pelo economista e pesquisador do Observatório Cidadão para Saúde (OCS), Pedro Nhanengue, no âmbito do Seminário que visava discutir os resultados da mesma pesquisa com diferentes intervenientes sociais, incluindo representantes do Governo.
Falando à margem do evento, organizado pelo OCS em parceria com Cooperativa Luana Semeia Sorrisos (COLUAS) e Fórum das Associações Moçambicanas de Pessoas com Deficiência (FAMOD), Nhanengue explicou que as pessoas com deficiência recorrem, na sua maioria, ao sector informal para ter acesso à assistência medicamentosa.
“Este sector é caracterizado pela instabilidade económica, num contexto em que o acesso a medicamentos, nas farmácias públicas, é irregular. Ou seja, os pacientes são obrigados a contrair dívidas apesar das limitações económicas”, disse o pesquisador.
Vulnerabilidade Financeira vs Difícil Acesso a Medicamentos
A pesquisa, de acordo com o economista, aponta que “pessoas com perspectivas de vida mais vulneráveis apresentam enormes dificuldades para ter acesso a medicamentos. As pessoas em alusão recorrem ao sector informal, na incerteza sobre como custear os medicamentos. Assim sendo, elas acabam recorrendo a dívidas para poder fazer face a despesas com medicamentos.”
O pesquisador apontou, igualmente, para a automedicação como um problema vivido por este grupo de pessoas.
“Pessoas com deficiência, quando não têm acesso a medicamentos, recorrem à automedicação, havendo riscos de morte ou overdose [dosagem acima do recomendado]”, disse Nhanengue, adiantando que “os maiores desafios para este grupo são estruturais, passam pelo transporte, educação e saúde, sendo que o medicamento representa só uma componente ínfima no dia-a-dia.”

Para a resolução dos problemas em causa, o pesquisador acredita que há necessidade de se criar leis específicas sobre acesso a medicamentos, assim como há necessidade de se destinar parte do Orçamento do Estado para aquisição de medicamentos para pessoas com deferência.
“Temos uma proposta de lei, seria muito importante que se agilizasse a aprovação da mesma, contemplando-se pessoas com deficiência. É importante que haja uma rubrica na Conta Geral do Estado que contempla este grupo social.”
Para o pesquisador, deve-se “estabelecer uma coordenação entre os sectores-chave, para que se amorteça a taxa de juros a que estas pessoas são expostas.”
O difícil acesso a medicamentos, sublinha o economista, está directamente ligado à pobreza extrema das famílias, num contexto em que mulheres, crianças e idosos são os mais vulneráveis.
“No geral, o grupo mais vulnerável são mulheres, crianças e idosos com deficiências”, afirma o pesquisador, citando estudo, adiantando que “menos que a metade das pessoas com deficiências, no universo do estudo, apenas têm acesso a iboprofem e paracetamol, que se encontram disponíveis no sector público.”
De acordo com a pesquisa, que esteve centrada em alguns bairros da Província e Cidade de Maputo, parte significativa das pessoas com deficiência é jovem, com idades compreendidas entre 18 e 35 anos, representando 8,1% do universo, com destaque para mulheres.
“Em termos globais, aproximadamente a 63% de pessoas com deficiência gastam no máximo 1.000,00 meticais para aquisição de medicamentos nas farmácias privadas, o que demonstra pouco poder de compra devido aos seus baixos rendimentos mensais, principalmente no sector informal, com mais destaque para as mulheres”, lê-se na pesquisa, citada pelo pesquisador.
Por seu turno, Marília Xerinda, em representação do Fórum das Associações Moçambicanas de Pessoas com Deficiência (FAMOD), apela a sociedade para que seja mais tolerante e aberta a pessoas com deficiência, dado que estas carecem de serviços sociais básicos por falta de protecção social.
“As pessoas com deficiência vivem na extrema pobreza, não têm meios de subsistência e não têm educação”, disse Xerinda.
De acordo com a fonte, “pessoas com deficiência debatem-se, também, com problemas de alimentação e habitação. O Governo não consegue responder a estas inquietações, as pessoas estão entregues à sua sorte.”

A população com deficiência em Moçambique corresponde a 2.7%, o equivalente a mais de 800 mil pessoas. Neste universo, 53% desta não tem acesso a medicamentos e 10% tem acesso irregular aos mesmos. Assim sendo, pelo menos 37% da população com deficiência tem acesso a fármacos no país.
A pesquisa foi levada a cabo em 2022, na Província e Cidade de Maputo, pelo Observatório de Saúde (OCS), em parceria com a Cooperativa Luana Semeia Sorrisos (COLUAS).

Leia a pesquisa na íntegra no link abaixo: https://www.observatoriodesaude.org/download/custos-economicos-e sociais-na-aquisicao-de-medicamentos-para-as-pessoas-com-deficiencia-em-mocambique-pedro-nhanengue/