Quando iniciaram os ataques armados na Província nortenha de Cabo Delgado, Elsa Manuel, de 29 anos de idade, já trabalhava como activista de saúde naquele ponto do país.

Durante o seu percurso como activista, Elsa já tinha visto um pouco de tudo: pessoas abandonado o tratamento e pessoas que, simplesmente, não queriam saber do tratamento nem quiser do seu estado de saúde. Mas nunca antes se tinha deparado com pessoas traumatizadas pela guerra, desnutrição e abandono ao tratamento de HIV/SIDA.

“Isto tudo cria um grande stress para as pessoas que vivem com a HIV. Nos centros de deslocamento, descobrimos várias pessoas nestas condições”, lamenta a activista, que afirma entregar-se apenas a um objectivo: “dizer às pessoas com HIV/SIDA que ainda há esperança.”

O conflito em Cabo Delgado iniciou em 2017, tendo já criado aproximadamente 1 milhão de deslocados e milhares de vítimas mortais.

Elsa afirma que, quando iniciaram os conflitos, juntamente com os colegas, não se sentia à vontade, mas mesmo assim sabia que devia fazer o seu trabalho para “pelo menos trazer essa esperança para as pessoas que se refugiavam noutros pontos da província de Cabo Delgado.”

Enquanto trabalhavam, um dos maiores problemas tinha que ver com a comunicação.

“Nem todos falavam a mesma língua connosco e isso constituía uma enorme dificuldade para nós. Tentávamos, a todo custo, fazer esse trabalho de testagem e aconselhamento para que as pessoas não desistissem do tratamento”, refere.

Nessa ocasião, o maior medo estava ligado ao facto de as pessoas que ainda estavam nas matas, possivelmente a viver com o HIV, tivessem que passar dias sem medicar.

Geralmente, as pessoas refugiavam-se em momentos tensos, sem tempo suficiente para fazer as malas. Por isso, muita coisa, bens e medicamentos, eram deixados para trás.

“Não tem como as pessoas pensarem em medicamentos quando estão a fugir de ataques. Algumas pessoas fugiam no meio do ataque, com apenas as roupas que trajavam”, conta.

Para trás, deixavam tudo, incluindo os medicamentos e as fixas referentes ao seguimento da medicação. Assim, tinham de começar novamente o processo todo.

Por isso, Elsa e colegas activistas iam ao encontro das pessoas deslocadas.

“Recordo-me que uma vez estivemos, durante 15 dias consecutivos, a fazer os testes e abrir novas fichas para os deslocados. Foi um tempo muito longo para nós.” 

De acordo com Elsa, neste processo de testagem e abertura de novos cartões, há pessoas que se surpreenderam com o seu estado de saúde e, imediatamente, deram início ao processo de tratamento.

Muitas destas pessoas ainda vivem em campos de refugiados e com a única mensagem de esperança que Elsa lhes dava: “ainda há esperança. Não é o fim da vida.”

“Ainda há estigma e discriminação”

No seu percurso como activista, fora dos campos de refugiados, Elsa viu pessoas abandonarem o tratamento e, por causa disso, encontravam-se debilitadas. Os corpos ficavam franzinos. Perdiam forças.

“Era triste”, comenta a activista, explicando que “muitas destas pessoas, em Pemba, abandonavam o tratamento por vergonha e estigma.”

Para Elsa, as pessoas têm medo de ser vistas a fazer levantamento de antirretrovirais. Quando era assim, ela deixava sempre duas mensagens: “não tenham vergonha. Salvem-se.”

Mas nem todos ouviam essa mensagem e, quando fosse assim, Elsa tinha apenas uma solução “ir levantar os medicamentos pelos doentes. Essa era a única solução, ou eles regrediam e, para voltar a recuperar, levavam muito tempo.”

Homens abandonam tratamento

Em 2021, as autoridades de Cabo Delgado anunciaram que cerca de 160 mil pessoas vivem com HIV naquela província e que os níveis de abandono eram dominados por pacientes de sexo masculino.

Segundo dados de 2015, patentes no Inquérito de Indicadores de Imunização, Malária e HIV/SIDA em Moçambique (IMASIDA), a Província de Cabo Delgado possui uma taxa de seroprevalência de HIV na ordem de 13.8 por cento, uma das mais altas de Moçambique.

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