Introdução

A discussão e a relevância do desempenho do sector de saúde em Moçambique têm sido cada vez mais intensas, na medida que se vai registando um crescimento demográfico, que em parte coloca sob pressão o sistema nacional de saúde. A melhoria da qualidade e do acesso aos serviços de saúde para todos constitui uma prioridade para o desenvolvimento, que consta das principais políticas estratégicas e operacionais, como é o caso do Programa Quinquenal do Governo (PQG) e do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado (PESOE), respectivamente. Entretanto, é necessário que haja provisão de recursos (humanos, financeiros e materiais)  ao sector da saúde em coordenação com os compromissos assumidos a fim de assegurar a qualidade, sustentabilidade, eficiência e proporcionalidade territorial na provisão dos serviços de saúde. Embora o impacto se reflicta no longo prazo, é necessário um conjunto de acções de curto prazo, considerados no PESOE, para alcançar tais objectivos.

O Sector de saúde é, em grande medida, financiado por fundos externos, tanto na realização de despesas de investimento, assim como para algumas despesas em bens e serviços correntes. O capital externo, sob forma de investimento directo ou empréstimos ao sector de saúde, tem desempenhado diversos papéis desde os primórdios da economia moçambicana e, neste âmbito, há uma necessidade de se promover um uso racional e sustentável dos recursos advenientes destas fontes de financiamento, sob o risco de poderem vir a constituir um peso na sustentabilidade do seu serviço, em caso de dívida pública e perda confiança dos parceiros, em caso de doações.

Neste âmbito, esta pesquisa apresenta constatações resultantes da análise da execução orçamental nos últimos cinco (5) anos, tendo em conta os principais compromissos sectoriais assumidos. Para o efeito, a pesquisa apresenta de forma comparativa a execução orçamental em relação ao tempo, a alocação orçamental em relação ao crescimento demográfico, bem como estabelece uma analogia entre a despesa planificada e executada do sector de saúde, olhando de forma especial os três âmbitos de alocação da despesa (distrital, provincial e central), tendo em conta algumas instituições relevantes a nível central.

Alinhamento do Valor da Despesa do Sector da Saúde com os Compromissos Sectoriais

De 2018 a 2022, a despesa do sector de saúde em relação à despesa total esteve abaixo dos 15%. Neste período, o peso médio da despesa do sector de saúde em relação à despesa total foi de 8,4%. O pico do peso da despesa do sector, no período em análise, foi registado em 2022 com 9,5%, representando um aumento de 1pp em relação ao ano anterior.

Gráfico 1: Peso da Despesa do Sector de Saúde vs Compromisso de Abuja (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base na CGE (2018 a 2021), PESOE (2023)

Evolução da Despesa do Sector da Saúde em Termos Nominais e em Termos Reais

Em termos nominais, a despesa do sector de saúde aumentou ao longo dos anos, saindo do MZN 23,1 mil milhões em 2018, para MZN 39,9 mil milhões, em 2022. Contudo, em termos reais, apesar de ter sido registado um aumento, nem sempre este aumento acompanhou a taxa de inflação. Assim sendo, de 2018 para 2019, houve uma redução real da despesa em MZN 1 mil milhões, e nos anos de 2020 a 2021 a despesa real reduziu em MZN 2,8 mil milhões.

Gráfico 2: Execução do Orçamento do Sector da Saúde em relação a taxa de inflação (em MZN mil milhões)

Fonte: Cálculos dos Autores com base no CGE (2018 a 2021) e BdPESOE (2022)

Despesa de Funcionamento e de Investimento do Sector da Saúde de Acordo com as Fontes de Financiamento

Nos últimos cinco anos (2018 a 2022), o sector de saúde executou, em média, 89% do orçamento alocado. Contudo, é importante destacar que, de 2020 a 2022, registou-se um progresso da execução da despesa para 92%, em média.

Tabela 2: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Descrição20182019202020212022
Plano27,426,134,834,343,3
Execução23,122,732,230,839,9
Execução (%)84%87%92%90%92%
Fonte: Cálculos do Autor com base no CGE (2018 a 2021) e BdPESOE (2022)

Do orçamento executado, no período em análise, 77%, em média, corresponde à despesa de funcionamento e apenas 23% é composto por despesa de investimento. Ademais, é possível perceber que, de 2020 a 2023, a despesa de funcionamento aumentou em 10pp em sacrifício da despesa de investimento que diminuiu em 10pp. Ou seja, entende-se que o governo tende a sacrificar o investimento no sector de saúde, principalmente no que diz respeito à construção de hospitais, compra de equipamentos, etc. por despesas que visam somente assegurar o funcionamento do sector.

Gráfico 3: Comparação Despesa de Funcionamento vs Investimento (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base na CGE (2018 a 2021) E REO do Sector da Saúde (2022)

Houve uma tendência de aumento da dependência externa para o financiamento da despesa de investimento do sector de saúde. De 2018 a 2022, o financiamento externo aumentou em 22pp. Por outro lado, o financiamento interno reduziu para menos da metade, ou seja, de 37% para 15% em 2018 e 2022, respectivamente.

Gráfico 4: Comparação da despesa de investimento por origem dos recursos (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base na CGE (2018 a 2021) E REO do Sector da Saúde (2022)

De 2018 a 2022, em média, quase dois terços da despesa do sector de saúde (62,8%) foram de âmbito central. Os restantes 17,6% e 19% destinaram-se ao provincial e distrital, respectivamente. No geral, é importante notar que, de 2020 a 2022, houve uma tendência de diminuição da despesa de âmbito central em detrimento da despesa âmbito provincial e distrital, saindo de 70,3% para 58%, respectivamente.

Gráfico 5: Comparação da Execução do Orçamento do Sector de Saúde por Âmbito (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução da Despesa do Sector de Saúde no Âmbito Central

No período em análise, a execução da despesa de âmbito central foi de, em média, 160%. Refira-se que o pico da Execução se registou em 2020 na ordem de 280%, um aumento de 185pp em relação ao ano anterior. De resto, esta execução pode estar associada ao facto de, entre 2020 e 2021, o sector da saúde ter beneficiado de ajuda externa para financiar a prevenção e tratamento da COVID-19.

Tabela 3: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do Sector da Saúde por Âmbito Central (2018 a 2022)

Descrição20182019202020212022
Plano15,216,912,620,825,4
Execução21,316,035,332,433,1
Execução (%)140%95%280%156%130%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Em média, 55% da despesa foi executada com despesa de funcionamento e o remanescente, 45% com despesa de investimento.

Gráfico 6: Comparação Despesa de Funcionamento vs Investimento por Âmbito Central (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Houve uma tendência de aumento do financiamento externo em detrimento do financiamento com recursos internos da despesa de âmbito central. No período em análise, o financiamento externo quase que duplicou, saindo de 48% para 83%, de 2018 para 2022. De forma contrária, o financiamento interno recuou quase em mais de três vezes, 52% para 17%, em igual período.

Gráfico 7: Nível de Execução do Orçamento do Sector da Saúde de Âmbito Central por Fonte de Recursos (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução da Despesa do Sector de Saúde no Âmbito Provincial

A despesa de funcionamento corresponde à maior parte da despesa de âmbito provincial, em média 79%, nos últimos cinco anos. As despesas de investimento constituem média anual de 21%.

Tabela 4: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do Sector da Saúde por Âmbito Provincial (2018 a 2022)

Descrição20182019202020212022
Plano5,84,96,38,96,8
Execução6,26,67,27,79,5
Execução (%)108%134%115%86%140%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

A despesa de funcionamento corresponde a maior parte da despesa de âmbito provincial, em média, 79%, nos últimos cinco anos. As despesas de investimento constituem média anual de 21%.

Gráfico 8: Comparação Despesa de Funcionamento vs Investimento por Âmbito Provincial (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Com relação à despesa de investimento, evidencia-se uma exacerbada dependência externa. Em média, 79% dos recursos são provenientes de fontes externas e apenas 21%, em média, procedem de fontes internas.

Gráfico 9: Nível de Execução do Orçamento do Sector da Saúde de Âmbito Provincial por Fonte de Recursos (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução da Despesa do Sector de Saúde no Âmbito Distrital

Com relação à despesa âmbito distrital, a tabela 7 indica que, no período em análise, a Execução foi de, em média, 130%.  Refira-se que se registou uma tendência de aumento da execução da despesa pública nos últimos três anos, de 115% para 171%.

Tabela 5: Comparação entre o Plano e a Execução da Despesa do Sector da Saúde por Âmbito Distrital (2018 a 2022)

Descrição20182019202020212022
Plano4,65,56,76,88,5
Execução5,36,77,78,714,5
Execução (%)115%122%115%129%171%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

A nível distrital, a disparidade entre despesa de funcionamento e de investimento é mais crítica. O gráfico 13 indica que, em média, no período em análise, cerca de 93% da despesa destinou-se a financiar despesas correntes, com destaque para despesas com pessoal. Por exemplo, em 2020, 2021 e 2022, a despesa com pessoal representou 87%, 85% e 88%, respectivamente. Ou seja, nos últimos três anos, em média, 87% da despesa de âmbito distrital destinou-se ao pagamento de salários e remunerações e outras despesas com pessoal. Por outro lado, a despesa de investimento representou, em média, cerca de 7% da despesa de âmbito distrital. Igualmente, é importante destacar que 100% da despesa de investimento é resultante de fontes externas.

Gráfico 10: Comparação Despesa de Funcionamento vs Investimento por Âmbito Distrital (2018 a 2022)

Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução do Orçamento por Instituição de Âmbito Central

Nos últimos 5 anos, o MISAU executou, em média, 85% da despesa planificada. O ponto mais alto da Execução do Orçamento registou-se em 2020, com 133%. No entanto, em 2021, a despesa diminuiu para o ponto mais crítico dos últimos cinco anos, 54%, em 2021, fixando-se em 59%, em 2022. Refira-se que, no período em análise, 100% da despesa do MISAU destinou-se à despesa de funcionamento.

Tabela 6: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do MISAU (2018 a 2022) (em MZN mil milhões)

Descrição20182019202020212022
Plano1.81.91.43.53.6
Execução1.81.61.81.92.1
Execução (%)97%83%133%54%59%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução do Orçamento do Hospital Central de Maputo (HCM). De 2018 a 2022, o HCM executou, em média, 72% da despesa. No geral, a Execução do Orçamento reduziu, se 82% em 2018, ponto mais alto, para 56%, em 2022, ponto mais crítico.

Tabela 7: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do HCM (2018 a 2022) (em MZN mil milhões)

Descrição20182019202020212022
Plano1.71.61.61.62.8
Execução1.41.11.21.21.6
Execução (%)82%71%74%76%56%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução do Orçamento da Central de Medicamentos e Artigos Médicos. A central de medicamentos executou, em 2019, 2020 e 2022, em média, 130% da despesa planificada. Em 2018, o orçamento mostra não ter havido, em princípio, nenhum valor alocado para Central de Medicamentos e Artigos Médicos.

Tabela 8: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento da Central de Medicamentos e Artigos Médicos (2018 a 2022) (em MZN milhões)

Descrição20182019202020212022
Plano278.4190.5186.90.0181.0
Execução 0.9272.2310.1168.3148.4
Execução (%)0%143%166% 82%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução do Orçamento do Instituto Nacional de Saúde. No período em análise, o Instituto Nacional de Saúde teve, em média, uma execução orçamental de 2019 a 2022 acima de 100%. Contudo, no primeiro ano em análise, não houve inicialmente algum valor alocado ao INS. Em 2019, a execução foi abaixo de 61% e nos anos subsequentes a execução foi superior ao plano, com 186%, 110% e 115%, em 2020, 2021 e 2022, respectivamente.

Tabela 9: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do Instituto Nacional de Saúde (2018 a 2022) (em MZN milhões)

Descrição20182019202020212022
Plano0.0104.460.1127.0174.6
Execução20.963.5111.6140.1201.3
Execução (%) 61%186%110%115%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução Orçamental do Centro Regional de Desenvolvimento Sanitário. Em 2018 e 2020, apesar do Centro Regional de Desenvolvimento Sanitário não ter planificado nada, teve uma Execução média de cerca de MZN 21,5 milhões. Contudo, em 2021 e 2022, a Execução esteve abaixo do planificado, 91% e 63%, respectivamente.

Tabela 10: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do Centro Regional de Desenvolvimento Sanitário (2018 a 2022) (em MZN milhões).

Descrição20182019202020212022
Plano0,00,00,025,236,1
Execução21,917,525,023,022,6
Execução (%)   91%63%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

Execução do Orçamental do Instituto de Ciências de Saúde de Maputo.

À Semelhança do Centro Regional de Desenvolvimento Sanitário, o Instituto de Ciências de Saúde não planificou a despesa para 2018 a 2020. Contudo, em 2021 e 2022, a Execução foi abaixo do planificado, 59% e 41%, respectivamente (vide o gráfico 13).

Tabela 11: Comparação entre o Plano e a Execução do Orçamento do Instituto de Ciências de Saúde de Maputo (2018 a 2022) (em MZN milhões)

Descrição20182019202020212022
Plano0.000.000.0038.5055.08
Execução24.420.917.322.922.6
Execução (%)   59%41%
Fonte: Cálculos do Autor com base no REO do Sector da Saúde (2018 a 2022)

RECOMENDAÇÕES

Leia aqui a Pesquisa Completa:

Uma resposta

  1. Excelente analise, penso que temos bons elementos para fortalecer o trabalho de advocacia para maior alocação de recursos domésticos a todos os níveis e maior equidade na redistribuição por subsistemas assistenciais. Neste alinhamento, gostaria de sugerir que trouxéssemos o volume de orçamento por fontes de financiamento, que neste período em analise, foi alocado a intervenções comunitárias e outras de extensão de serviços (Brigadas Moveis) destinadas as comunidades mais carentes e de difícil alcance.

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