Mário Chissano sempre viu pessoas a entrarem no hospital próximo da sua residência no distrito de Panda em Inhambane quando era mais novo. Algumas dessas pessoas apresentavam um aspecto doentio e outras com ferimentos no corpo resultante de vários tipos de acidentes.
À saída do hospital parte destes utentes pareciam ter uma aspecto melhor. Com as expressões faciais melhoradas e com os ferimentos cobertos por ligaduras, Mário Chissano entendia que todos que se faziam àquela unidade sanitária tinham os seus problemas resolvidos.
“Foi aí que iniciou o meu interesse pela enfermagem. Na altura não sabia distinguir quem era o enfermeiro e quem era médico”, disse Mário Chissano.
Mas de uma coisa tinha a certeza, “ as pessoas saiam sempre do hospital melhor.”
Com o passar dos anos o sonho e o desejo do actual enfermeiro no Hospital Geral da Machava foram aumentando. E este sonho apenas se veio concretizar quando este já havia atingido a vida adulta.
“Entre 2005 e 2006 eu fui cumprir com o serviço militar obrigatório. E lá eu tive mais certeza que era isto que eu queria fazer”, contou.
Mário Chissano explicou que quando estava cumprindo com o serviço militar em Montepuez, na província de Cabo Delgado, foi incumbido da tarefa de ajudar os médicos do posto de saúde local.
“Foi ali que mais certeza tive que era isto que eu queria para mim. Eu gostava de ver os médicos a cuidarem dos doentes. Aquele ambiente me fascinava”, afirmou.
Depois de concluir o serviço militar, Chissano decidiu ir atrás do seu sonho, mas antes era necessário concluir o ensino geral, “eu tinha interrompido os estudos, mas depois de cumprir com o serviço militar decidi retornar ao banco da escola para concluir aquela etapa dos estudos e só então concorri para o curso de enfermagem. Fui admitido em 2008 para fazer o meu curso em Inhambane.”
Em Fevereiro de 2010, Mário Chissano ainda estava nos primeiros meses a trabalhar como enfermeiro, depois da formação que iniciou em 2008. Chissano já não mais era estudante estagiário. Tudo dependia dele. Tinha mudado de posição e a responsabilidade era maior.
Ele conta que o maior susto que teve quando iniciou a sua carreira profissional não esteve relacionado com o manter contacto com pacientes, mas sim em ter a responsabilidade de ter todo um serviço sob a sua responsabilidade.
“Eu já tinha estagiado antes e, por isso, já tinha estado em contacto com doentes. A diferença é que quando entras como funcionário sabes que a enfermaria é o teu local de trabalho. Você está ali como profissional e não como estudante. É natural que em algum momento surja aquela dúvida, será que vou conseguir? Mas no fim do dia quando os colegas dizem que está tudo bem é nesse momento que vem a sensação de que valeu a pena!”
Nós criamos laços de familiaridade com os pacientes
Chissano conta que uma das maiores dificuldades é anunciar a morte de pacientes aos seus familiares. “Nós acabamos criando laços de familiaridade de tal forma que me custa anunciar o desaparecimento físico de um doente aos seus ente-queridos.”
O ano de 2010 foi o primeiro em que ele teve essa experiência. Uma paciente tinha dado entrada doente, mas passando alguns dias ela apresentava melhoria, tendo recebido a visita de familiares e a conversado com eles. Contudo um dia antes da sua alta esta ela perdeu a vida.
“Ela conseguia, inclusive, comer. Conversava com os familiares, mas no dia seguinte, ela perdeu a vida”, lembra, acrescentando que, “aquele foi um dos piores momentos da minha vida profissional. Foi tão mau que não consegui informar a família. Nós criamos laços de família com os pacientes e seus familiares de tal forma que quando há situações idênticas a estas é complicado informar.”
“A doente nos cumprimentou”
Ele recorda que um dos momentos mais marcantes foi quando deu entrada uma doente que estava inconsciente. Apesar de todos os esforços que estavam sendo envidados não havia certeza se a paciente ficaria melhor.
Num dia em uma visita de rotina, do nada, enquanto a equipe médica estava na sala onde a doente se encontrava, ela os saudou.
“Aquele foi um momento marcante. Toda equipe aplaudiu. Abraçamo-nos todos. Foi muito bom”, lembra o enfermeiro, acrescentando que “ fui formado para ajudar pessoas sem esperar nada em troca. Minha satisfação é cruzar-me com alguém na rua e ela me cumprimentar e me informar que esteve doente um dia e, que eu a ajudei para melhorar o seu estado de saúde.”
História emocionante. Existem vários outros Chissanos, mas porque também existem tantos diferentes e indiferentes a sua profissão, acabamos não percebendo da existência de enfermeiros que fizeram o curso por vocação e que se identificam com a profissão de Enfermagem. Estamos agora num desafio em que todos reclamamos do atendimento dos profissionais de saúde, incluindo os próprios profissionais apontam-se uns aos outros sobre alguma experiência desagradável vivida pelo atendimento do seu colega.
E agora o que fazemos? A quem esperamos que virá mudar a situação?
Está na hora de pararmos de lamentar e passarmos para acção!!!