
A Associação Médica de Moçambique (AMM) anunciou recentemente a retoma da greve dos Médicos, suspensa em Dezembro de 2022 para dar lugar a negociações com o Governo, através do Ministério da Saúde (MISAU). A greve, que consiste na paralisação de actividades em todas unidades sanitárias, entra em vigor a partir do dia 10 de Julho corrente, podendo ser prorrogada por 21 dias, abrangendo quase todos os serviços.
O anúncio da retoma da greve surge dias depois de o Observatório Cidadão para Saúde (OCS) ter publicado uma reportagem referente à possível greve silenciosa em diversos hospitais, mesmo depois de a Associação dos Profissionais de Saúde Unidos e Solidários de Moçambique (APSUSM) ter alcançado consensos com o MISAU. Leia a matéria completa através do seguinte link: https://www.observatoriodesaude.org/cobrancas-ilicitas-morosidade-e-intimidacoes-evidenciam-possivel-greve-silenciosa-na-saude/
Retornando aos primórdios da batalha reivindicativa, a Associação Médica, no dia 27 de Outubro de 2022, achou ideal entrar a greve, uma vez que não se alcançava consensos na mesa de negociações com o governo. Entretanto, no dia 06 de Novembro, acreditando na boa fé do Executivo, o grupo decidiu remarcar o início da 3ª Greve Nacional da Classe Médica para o dia 05 de Dezembro de 2022, como forma de dar tempo ao Governo para que pudesse encontrar respostas para as questões apresentadas no caderno reivindicativo.
Não tendo havido resposta satisfatória, realizou-se, de 05 a 22 de Dezembro, a 1ª Fase da 3ª Greve Nacional da Classe Médica. Esta greve, entretanto, viria a ser suspensa “com o objectivo de proporcionar maior segurança e tranquilidade ao povo moçambicano durante a quadra festiva, e conceder tempo ao Governo para encontrar formas de satisfazer as reivindicações da classe médica, em forma de resposta ao apelo do Presidente da República.” Já em Fevereiro de 2023 foram estabelecidos novos acordos entre o Governo e a AMM.
De acordo com o documento, “Para agravar esta situação, nos meses de Maio e Junho, observou-se uma redução salarial considerável para muitos médicos, sem justificação e sem explicação prévia. Esta situação degradante levou os médicos a convocarem uma reunião nacional, que decorreu no passado dia 07 de Junho, onde o grupo decidiu dar início à 2ª Fase da 3ª Greve Nacional, a partir do dia 10 de Julho de 2023 por 21 dias prorrogáveis.”
“A greve iniciará às 07:00 horas, abrangendo todos os médicos em serviço na Administração Pública, em todo o território nacional, afectos às unidades sanitárias públicas e instituições subordinadas ao Ministério da Saúde (MISAU)”, acrescenta o documento.
A nível das instituições tuteladas pelo MISAU, serão afectados os Serviços Provinciais de Saúde; Direcções Provinciais de Saúde; Serviços Distritais de Saúde, Mulher e Acção Social; Vereações Municipais de Saúde; Instituições de Investigação; Instituições de Formação em Saúde; Centros de Exames Médicos; armazéns de medicamentos e artigos médicos.
Serviços Mínimos Serão Poupados
No entanto, a classe médica garante que, durante o período em que a greve estiver em curso, serão garantidos os serviços mínimos de Urgências e Reanimação de adultos e pediátricos; Urgências de Ginecologia e salas de partos; Blocos operatórios de urgências; e Serviços de internamento (enfermarias).
No que diz respeito a actividades a serem paralisadas durante a greve, o destaque vai para as consultas externas, incluindo as de atendimento especial/personalizado; cirurgias electivas; exames auxiliares de diagnóstico de carácter electivo.
“Fazem parte, também, da lista das actividades abrangidas os procedimentos médicos diagnósticos electivos, incluindo as autópsias; todas as actividades de saúde pública; actividades de ensino em todas as instituições de formação em saúde do sector público (centros de formação, institutos e universidades); e actividades de tutoria/supervisão de estágios nas unidades sanitárias”, afirma a classe.
A Associação Médica garante ainda que os serviços mínimos deverão ser assegurados pelos médicos que, embora sejam associados e solidários para com as reivindicações da classe, por diversos motivos não podem participar na greve, designadamente, os médicos militares e os médicos estrangeiros.
“Os directores gerais, clínicos e de serviço, querendo, podem prestar serviços mínimos”, afirma.
Segundo a AMM, os médicos abrangidos pela greve não se deverão apresentar ao local de trabalho, ao passo que os escalados para a prestação dos serviços mínimos dever-se-ão apresentar aos seus respectivos locais de trabalho, nos horários em que estiverem escalados de modo a garantir o atendimento aos pacientes.
“Durante este período, a AMM anunciará actividades de carácter social ou reivindicativo para os médicos em greve. Qualquer tentativa de violação do exercício do direito à greve, incluindo tentativas ou consumação de ameaças ou coação, levará à mudança das directrizes traçadas, com consequente paralisação total de todas as actividades médicas, incluindo os serviços mínimos”, explica a classe.
A AMM vai retomar a greve numa altura em que a Associação dos Profissionais de Saúde Unidos e Solidários de Moçambique (APSUSM) suspendeu a sua por 60 dias para dar espaço ao Governo, de modo que analise e solucione as suas reivindicações.
Sobre as reivindicações da AMM, assim como com as da APSUSM, o Observatório Cidadão para Saúde reitera o seu posicionamento, afirmando que a greve dos profissionais de saúde afecta negativamente o Sistema Nacional de Saúde e os serviços prestados aos utentes.
Aliás, as sucessivas greves revelam o contínuo braço de ferro entre os profissionais de saúde e o Governo. Por um lado, evidencia-se que o Governo carece de mecanismos (ou vontade) para responder a reivindicações levantadas pelos profissionais de saúde. Por outro lado, evidencia-se que os problemas que se fazem sentir no Sistema Nacional de Saúde, para além de serem financeiros, residem na falta de entendimento entre os médicos e o Governo.
Assim sendo, como entidade da sociedade civil em prol do bom funcionamento do sector da saúde, apelamos, mais uma vez, o bom senso do Executivo moçambicano, no sentido de resolver os problemas, tantos dos médicos, como de toda a classe de profissionais de saúde, como forma de evitar que os utentes sejam sacrificados, uma vez que são os mais lesados nestas contendas.